[SUL] Crimes cruéis levam medo às ruas de Canguçu.
Uma população assustada busca explicações para os crimes de grande impacto na sociedade, formada na sua maioria por pequenos agricultores. A violência que paira sobre Canguçu é motivo de comentários pelas ruas. Falta de efetivo na Brigada Militar e na Polícia Civil? Peculiaridade de município considerado o maior minifúndio da América Latina? São perguntas que podem virar tema de estudo.
O professor e pesquisador da Universidade Católica de Pelotas (UCPel), Luiz Antônio Bogo Chies, diz que é difícil avaliar a situação da criminalidade na cidade de 55.462 (estimativa populacional em 2013, segundo IBGE), sem uma pesquisa mais aprofundada, mas que os índices apontam que está na hora da região ganhar um estudo sobre a violência nas cidades do interior, principalmente aquelas com alguma particularidade. “Sabe-se que em Canguçu houve um aumento no caso de suicídios.”
Mas são os crimes com requintes de crueldades que têm chamado a atenção dos moradores. Em menos de um mês, um bebê foi encontrado por vizinhos no pátio de uma casa abandonada, na estrada da Pedreira. Cães estavam comendo partes do corpo da vítima. A mãe foi identificada, indiciada pela Polícia e está presa.
“Mal encerramos o inquérito do bebê e já nos deparamos com o latrocínio”, admite a titular da Delegacia de Polícia, delegada Paula Vieira. Ela se refere à morte a facadas de Selma Reichow, 69, e o estupro de sua bisneta, 2,8 anos, na manhã de sábado, dia 7, feriado da Independência. O suspeito, Gilberto Zarnott Júnior, de 22 anos, foi preso em flagrante com pertences da vítima, uma faca e está no Presídio Estadual de Canguçu.
“Não vou entrar no mérito da falta de efetivo, mas o município tem uma grande extensão de área. Então nossa meta é esclarecer e coibir casos de homicídios consumados e tentados, a partir de prisões e com apreensões de armas.” Desde o início do ano, dez pessoas foram presas. Paula Vieira não tem como apontar estatisticamente a relação, mas diz acreditar que o tráfico de drogas influencia diretamente na prática de outros crimes, como roubos e furtos. “Recebemos bastante denúncias e com isso passamos a realizar operações na área rural, principalmente no 5º distrito.”
É neste local que a Delegacia de Polícia ainda não conseguiu desvendar duas mortes. O assassinato de um agricultor, na tarde do dia 8 de julho. Valcelino Gomes Padilha, de 41 anos, foi atingido por disparos de arma de fogo de caça quando chegava às margens do rio Camaquã, na localidade do Passo da Guarda. A vítima era moradora de um assentamento.
“Já o caso da jovem Rejane, encontrada morta quase na divisa de Camaquã, também não conseguimos encerrar, pois até agora não temos a causa da morte”, admitiu Paula Vieira. Rejane da Fonseca Longaray, de 21 anos, desapareceu no dia 25 de agosto de 2012 e foi encontrada na tarde do dia 9 de setembro, na costa do rio Camaquã, próximo ao assentamento Arroio das Pedras, também no 5º distrito. Um cão teria guiado parentes até a localidade, sendo que as roupas e as características da arcada dentária deram indício que o corpo em avançado estado de decomposição seria o da jovem.
Caso Maiara
O crime de maior repercussão na cidade ainda é o da jovem Maiara Schellin Kholer, de 20 anos. Ela desapareceu no dia 7 de julho do ano passado e seu corpo foi encontrado três dias depois, em um matagal, no Rincão dos Maias, interior do município. A jovem foi estrangulada e o principal suspeito é o ex-namorado – B.B.B., 19. Ele foi indiciado pelo Ministério Público (MP) por homicídio doloso por motivo torpe e ocultação de cadáver e permanece preso preventivamente.
Morta a enxadadas
Violência contra a mulher também está entre os crimes ocorridos em Canguçu. No dia 23 de setembro de 2012, a enfermeira Gleice Brum Conceição, de 37 anos, foi encontrada morta a golpes de enxada na localidade de Boa Vista, 3º distrito. O crime passional teria sido cometido pelo namorado, Adelar Cunha de Moura, de 30 anos, que sofria de depressão. Logo depois, ele usou uma corda para se enforcar na garagem. Adelar era natural de Canguçu e trabalhava na fazenda onde ocorreu o crime.
Falso boato
O boato de que Gilberto Zarnott Júnior, de 22 anos, suspeito de ter matado a idosa Selma Reichow e estuprado sua bisneta, teria sido libertado na terça-feira (10), deixou os familiares das vítimas em estado de choque e de alerta. A reportagem conversou com uma das filhas da vítima de latrocínio, enquanto se preparava para ir até a Delegacia de Polícia confirmar a informação que não as deixou dormir à noite. “Estamos desoladas, sem saber o que fazer”, disse Nivia Reichow da Silva, 49. Ela encontrou um parente do acusado que garantiu que a família dele não estaria movendo ação para libertá-lo.
A confirmação da prisão do suspeito partiu da promotora de Justiça, Camile Balzano de Mattos, que sustenta a manutenção da preventiva de Gilberto. “Até o meio-dia de hoje (terça) não havia pedido nenhum de soltura”, garantiu. A Justiça, segundo a promotora, pensa numa possível transferência do preso, uma vez que ele sofreu lesões na casa prisional. “Fomos analisar a ficha do suspeito que constou muitos processos”, admitiu Camile.
Recuperação
A dor pela perda de Selma está sendo sustentada na esperança pela melhora da bisneta, estuprada no dia do crime. Ela está internada no Hospital Universitário São Francisco de Paula (HUSFP), em Pelotas, em fase de recuperação, conforme informou Nivia. “Achamos que ela demorou muito tempo para ser atendida. Somente à noite é que a pequena passou por cirurgia de quatro horas”, reclamou. O MP deve investigar a situação. Já a casa onde ocorreu o crime que chocou a comunidade de vila Nova, está fechada.
Roubos e furtos
Os crimes contra a vida não são o único fator que deixa a comunidade insegura. A agricultora Neusa Oliveira, de 51 anos, espera que a violência da cidade não chegue à área onde mora. No distrito que abriga a localidade da Florência ainda é possível manter hábitos antigos. “É muito tranquilo onde eu moro. O problema é aqui na cidade. Tem que cuidar tudo. Até para mexer com o dinheiro”, disse à reportagem enquanto descansava sentada em um banco da praça. Neusa atribuiu a violência ao aumento no consumo de drogas.
Quem compartilha a opinião de Neusa é o taxista Osvaldir Henzel, de 48 anos. “Está de mal a pior. O crime como o roubo estão crescendo assim como a desumanidade. A droga está tomando conta.” Como motorista de táxi, Henzel diz que não pode selecionar quem entra no seu veículo, nem mesmo se está armado. “Tenho que me apegar a Deus.”
Já o aumento no efetivo seria a solução para a redução da criminalidade, no ponto de vista do funcionário de uma agropecuária, Albino Brehm, de 42 anos. Enquanto o reforço no policiamento não é possível, ele e seus colegas adotam medidas de segurança própria, principalmente na hora de fechar o estabelecimento, para não virar alvo de assaltantes.
Zona rural
Morador do 2º distrito de Canguçu, o agricultor Claudiomir Rutz Maass, de 40 anos, diz que dois comerciantes foram assaltados na colônia e cada um arcou com prejuízo de R$ 5 mil. “Às vezes a gente liga para a polícia e ela não vem.”
O que diz a Brigada Militar
Ao contrário da opinião dos entrevistados, para o comandante da 4ª Companhia de Canguçu, capitão Anderson Wenitt, é baixo o número de ocorrências na zona rural em relação a outras localidades. “Adotamos em Canguçu a Operação Paz nos Bairros, porque deu certo em Pelotas. Também são feitas barreiras em veículos de fora da cidade e patrulhamento nos distritos do município.” Eventualmente, o efetivo do Pelotão de Operações Especiais do 4º Batalhão de Polícia Militar (POE/4ºBPM), é deslocado até a cidade para atuar no policiamento ostensivo.
Fonte: http://www.diariopopular.com.br/index.php?n_sistema=3056&id_noticia=NzM1Nzc=&id_area=Nw==